A Loucura: a contenção de Si-mesmo
Você já sentiu que está sempre usando uma camisa-de-força para segurar-se em Si mesmo? Uma conversa sobre a “loucura”.
Psicólogo Clínico e Psicanalista
CRP 06/123471
Bom e Ruim, Bem e Mal, Luz e Sombras. Uma reflexão.
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O balanço entre “Bom” e “Ruim” não é comumente visto como algo natural, mas como um desequilíbrio que precisa ser evitado. Esta reação ao Ruim é um fenômeno que experienciamos desde o nosso nascimento, por exemplo: imagine um bebê que acabou de nascer, quando ele respira pela primeira vez tem a sensação de “Como dói respirar!”. O choro é a consequência desta dor, por isso ele solta o berreiro…
Então por doer e fazer chorar, isso é ruim?
É claro que é ruim, pois dói. Podemos chamar isso de uma reação negativa ao ambiente, certo? O ar entrando nos pulmões deste bebê, que até então estavam cheios de líquido amniótico, não é a sensação mais agradável. Há de fato algo Bom e Ruim aqui, pois este choro é Bom apesar da experiência deste bebê ser Ruim. E quem melhor pra entender sobre isso do que todos adultos dentro da sala de parto? Esses mesmos adultos que, no futuro, ensinarão outras coisas Boas e Ruins para este bebê. Um dia, talvez, quando este bebê crescer, ele ouça durante a conversa dos adultos que o choro de qualquer bebê ao nascer é Bom por ser a primeira coisa que os pais ouviram dele: o bebê que estes pais tanto desejaram está vivo! Talvez assim este bebê, já mais crescido, refaça suas ligações simbólicas para, mesmo que inconscientemente, perceba que o trauma do nascer foi bom, ele é bom…
Neste caso, o Bom e o Ruim se desfazem, pois algo que dói pode ser para o bem também.
Então “dor” é algo bom? Não necessariamente, se é que vocês me entendem, mas não é sobre isto; é sobre perceber a realidade como ela é: real. E nesta realidade temos a Dor e o Alívio lado a lado desde os primórdios da Humanidade. Existem algumas teorias sobre isso, como por exemplo: a teoria das Pulsões de Freud, em que há duas forças antagônicas de mesma intensidade que são chamadas de Pulsão de Vida e Pulsão de Morte; ou como em Melanie Klein, a respeito do Seio Bom e do Seio Mal; ou como nas teorias da personalidade Anima e Animus de Carl Jung; como também no Yin e Yang do taoismo, uma religião chinesa antiga. Em todos exemplos, ambas forças não estão necessariamente relacionadas com Bom ou Ruim e sim como duas forças que compõem o mesmo ser.
Pensando bem, e incluindo os exemplos que acabei de dizer, podemos até caracterizar o “Bom e Ruim” como “Bem e Mal”; duas forças antagônicas com pesos diferentes que, como na cultura judaico-cristã, é a Perfeição contra o Imperfeito; a extrema paz contra a extrema perturbação; Luz e Sombras.
Como estou falando sobre culturas e não discutindo conceitos de Fé, podemos analisar sob a ótica da dicotomia (oposição de dois elementos) destas forças e como as representamos, que pode ser também cultural.
Se pararmos para avaliar algumas outras religiões antigas, os deuses podem não ser ‘todo bom’ ou ‘todo mal’. Vou dar um exemplo: no hinduísmo, uma religião originária da Índia, existe um deus supremo chamado Shiva. Este deus possui quatro braços e sua função é ser o transformador, por isso ele é conhecido como “O destruidor e o regenerador”. Ué?
Shiva não é bom nem mal, ele é. Mesmo que sua função seja destruir, ele irá regenerar em algo novo; este é o ciclo da vida! Podemos chamar Shiva de um deus mal se houver um desastre natural?
Engraçado, não é? A gente vive ao redor de coisas que nascem e morrem todos os dias. Morte e Nascimento diante de nós, o Bom e o Ruim acontecendo, cada um em um ponto de vista diferente.
Imagina comigo o cenário: você foi a um casamento de um grande amigo e ganhou de lembrança uma planta com flores. Vai chegar uma hora que esta flor irá murchar, cumprindo seu papel, e será reciclada pela própria planta ao cair na terra. Para esta planta, a morte da flor é apenas um processo natural, pois a planta continuará viva e saudável, o que é algo Bom. Só que para você que tem muito apreço pela planta por ser do casamento do seu amigo, a morte da flor te deixa triste e te faz pensar: “Será que não reguei direito? Eu sou o culpado pela morte dela?”, algo Ruim.
Apesar de nós existirmos em um gráfico emocional bem turbulento diariamente, tendemos a observar qualquer evento cortado de uma fração do tempo e a julgarmos como Bom ou Ruim, em uma eterna busca pela Perfeição; Mas você já reparou que você é um Ser Humano vivendo em um Mundo em que as duas forças coexistem? Ignorar a parte má de Si ignora, em mesmo grau, a parte boa de Si.
Sem a parte má, a boa tem qual significado? Qual propósito?
Saber que o seu “Mal” existe e acolhê-lo não lhe dá liberdade para ser violento, não me entendam mal; mas contraintuitivamente liberta a nós mesmos de sempre estarmos fixados em nosso “Bom”, abrindo a possibilidade de falhar, estar com raiva, ficar triste, sentir a frustração, e por assim vai… Dando sabedoria e consciência em nossas decisões não por culpa ou ansiedade, mas por escolha.
Que venham os erros, pois ser Ruim também é humano.
FREUD, S. (1999). Interpretação dos sonhos. Rio de Janeiro: Editora Imago.
KLEIN, M. (1975). Inveja e gratidão e outros trabalhos, 1946-1963. Rio de Janeiro: Editora Imago.
JUNG, C. G. (1984). O homem e seus símbolos. Rio de Janeiro: Editora Imago.
Você já sentiu que está sempre usando uma camisa-de-força para segurar-se em Si mesmo? Uma conversa sobre a “loucura”.
Você já parou para pensar que o “pensar”, inclusive este que te motivou a continuar lendo este texto, está apenas e exclusivamente em sua mente?
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